Relatório poético a Tiradentes
Dora da Silva Quirino Ribeiro
INTRODUÇÃO
Este relatório de viagem pretende compartilhar minha experiência individual durante uma visita a Tiradentes, Minas Gerais, e regiões adjacentes. Ao decorrer deste trabalho, serão manifestadas as emoções e sensações que emergiram em cada local visitado, proporcionando uma perspectiva pessoal e sensível da viagem. Cada tópico terá sua transição por poemas de minha autoria, que traduzem os sentimentos provocados pelos diferentes ambientes e momentos vivenciados.
O trabalho está organizado em algumas seções, começando com o trajeto inicial do ônibus “Ônibus – Início”, passando pela visita à Fábrica de Pisos Hidráulicos em Barbacena, e explorando diversos pontos de interesse em Tiradentes, como o Museu de Santana, a Pousada do Bebeto, e o Museu do Padre Toledo. A viagem inclui ainda uma visita a São João del-Rei, o Museu da Liturgia e a Fazenda do Jacó, encerrando com o retorno de ônibus “Ônibus – Volta”.
A estrutura deste relatório procura não apenas documentar os eventos e locais visitados, mas também oferecer uma imersão nas sensações e reflexões pessoais que surgiram ao longo da viagem, permitindo ao leitor uma conexão mais profunda com minhas experiências descritas.
ÔNIBUS – INÍCIO
Petrópolis, 03 de junho de 2024
Eram 08 horas da manhã de uma segunda-feira comum em Petrópolis e o ponto de encontro marcado foi a Catedral São Pedro de Alcântara. Todos nós (alunos e professoras) nos rodeávamos de anseios, achismos e expectativas a respeito da viagem para Tiradentes.
Quando o carro chegou, fomos apresentados ao tio Jô (o motorista).
O ônibus, nesse primeiro encontro, foi lugar de conforto e descanso. A viagem mal começara e o grande carro já era sim um local de risadas e sono profundo.
No automóvel
Pernas, mochilas, sapatos entrelaçados
Ao olhar pela janela era a ansiedade que falava
Vistas passavam, morros se viam e só o que faziam
-Dormiam.
FÁBRICA DE PISOS HIDRÁULICOS (BARBACENA)
Após um almoço de respeito no caminho, nos dirigimos até a fábrica de pisos hidráulicos. O local mais parecia uma casa, daquelas que abraça e é nítido o movimento do uso cotidiano. A sensação era de adentrar esses quintais familiares e, conhecendo, através de amistosas conversas, os profissionais, a filosofia dos quintais só se concretizou.
Os aprendizados foram gigantes, das materialidades até as formas, os ensinamentos foram passados e as dúvidas reformuladas. Todo o processo de feitura dos pisos me tocou, sobretudo após esbarrar em diversas existências que ali atuavam há anos, como seu Germino, que trabalhava na fábrica há 23 anos e, no mesmo compasso temporal, era responsável pela mistura das tintas de “ganomita” em pó.
Para eternizar esse momento e termos algo como lembrança da fábrica, foi permitido que escolhêssemos um fragmento de piso para levar conosco. Rapidamente esse um se tornou um fragmento grande e outro pequeno… e mais rápido ainda, muitos os fizeram ser 2..3…ou até mesmo cinco, mas isso é outra história.
Voltamos felizes, com alguns quilos a mais nos braços, para o ônibus.
Quintais
Dos quintais que visitei, por esse me apaixonei
Era calmo e produtivo, como nunca sonhei
Vi de perto a feitura e por ela eu desejei
Saí com elas nos braços, pois de fininho eu ganhei.
MUSEU DE SANTANA
Já abalados pelas longas horas do percurso, finalmente nos vimos em Tiradentes e em nossa segunda parada, o Museu de Santana. Entramos por uma parte que havia sofrido mudanças em sua estrutura, essa que lhe foi projetada para atender às demandas de acessibilidade, no local. O equipamento projetado era esteticamente admirável e, ao longo do ambiente, o aroma de óleos essenciais se misturava com a fragrância do café, da cafeteria interna.
Era possível observar a construção original ao fundo, e como a nova o conectava no espaço. Apesar do grande rasgo feito em sua estrutura, o sentimento de leveza e permeabilidade foi identificado. Foi preciso ir para o prédio antigo, para compreender o mesmo e suas mudanças funcionais.
O atravessar no acesso era como uma máquina do tempo.
Era lindo e tranquilo.
O curioso veio depois, após descobrir que a origem do museu, na verdade, era uma cadeia pública. Difícil associar a um espaço que hoje se desdobra para o avesso de suas raízes.
Apesar de suas janelas fechadas e de sentir como uma incoerência para o uso, a visita ao Museu de Santana foi como um abre-alas da viagem. Todo seu acervo de estátuas da Santa Ana nos colocou nessa atmosfera de prestígio cultural, que seria muito vivenciada nos próximos dias.
Aroma
Ali parada, observava
Sentia o cheiro do estado de forma clara e palpável
A mistura de tudo me encantava
O novo, o antigo a bossa daquela casa
Por mais que me chocasse, sua forma eu lapidava
E na medida que entendia, prestigiava.
POUSADA DO BEBETO
Quando o céu começou a escurecer, chegávamos à Pousada do Bebeto, onde íamos dormir e descansar nessa viagem. Meu quarto ficava na parte de cima e era grande e confortável, além de uma sacadinha compartilhada que nos rendeu longas conversas noturnas. Sentir-se em casa e já me espalhar em cada gaveta ou baú foi tarefa fácil.
Logo após a divisão dos quartos e a troca de muitos deles pelos dos companheiros, a turma toda decidiu desbravar as redondezas da pousada em busca de um lugar para resolver nosso maior problema. A fome.
Finalizamos a primeira noite na cidade de Tiradentes em um restaurante com comida cara, porém boa. Ao som de uma música ao vivo que, ao contrário da comida, só tinha o caro.
Canto
Aqui fui eu
Aqui me fiz
Fiz desse canto, lugar feliz
Havia tantos
Havia já
Já não queria, mas eu voltar
MUSEU DO PADRE TOLEDO
Tiradentes, 04 de maio de 2024
Acordamos cedo e o primeiro lugar que visitamos foi o Museu do Padre Toledo. Logo na entrada, algo me fez sentir que seria um casarão e tanto, não sei se pela organização já na recepção, ou pelas espiadas que já dava para dentro do museu.
O espaço contava com peças referentes à história da Inconfidência Mineira e alguns mobiliários, adornos e imagens da época. O edifício foi residência do inconfidente mineiro e padre Carlos Correia de Toledo e Melo, de onde veio o nome.
Dentro de cada sala, cada uma com suas exposições e paredes preenchidas com informações e objetos, o que me tirava o ar (já escasso pelo resfriado que peguei), eram os tetos.
Cada troca de ambiente era como uma surpresa. Cheguei a ignorar por completo a explicação do mediador e passar longos minutos imaginando aquelas pinturas sendo desenhadas. Quem pintou? Com o que pintou? Quem pediu, decidiu, os modelos?… e tantas e tantas outras perguntas.
Teto
Eu olho para o alto, vejo mais
Mais cor, mais vida que me trás
Sinto tanto tudo isso, me dá vontade de ficar
Não sei de onde veio, não me importa
Quero estar.
Eu vejo e imagino, cada parte, cada um
Seja o teto, seja chão
Para mim, imensidão.
SÃO JOÃO DEL REI
Após o almoço no restaurante Montanhas, tio Jô nos levou direto para São João del-Rei. Lá foi berço para diversas idas a igrejas. Não sei se pela distância com a religião ou pela proximidade à história, tais espaços não costumam me “fazer” hipnotizar, a não ser pela beleza ou grandeza que muitas possuem. Pensar nos métodos construtivos, materiais e no patrimônio que são é o que me faz deslumbrar.
Ao olhar cada altar, cada estátua ou imagem simbólica, me vinha sempre um sentimento de revolta. Para mim, é impossível vivenciar esses espaços sem que meus pensamentos remetam, quase que diretamente, ao período de exploração do povo africano no Brasil. Além do que a Igreja Católica simbolizou e deixou como dura consequência para grande parte do globo.
Apesar disso tudo, São João foi um abraço para a alma. Descobrir as ruelas, caminhar a esmo pelas ruas de pé de moleque era sinônimo de alegria e descanso. Quase sempre éramos rodeados de sensações que confundíamos como miniférias. A certeza de que já, já terminara, era um impulso forte para viver tudo, com muita intensidade.
Bão
Caminho por essas ruas e me pergunto a cada uma
Que raios de cidade linda, sinto rua me sinto tua
Queria poder ficar, desbravar e encontrar
Pena que coisa boa passa e a ruim gruda a ficar.
MUSEU DA LITURGIA
Tiradentes, 05 de maio de 2024
Fomos caminhando pelas ruas de Tiradentes até chegar ao Museu da Liturgia, esse que foi escolha minha e de meu grupo, esmiuçá-lo. O primeiro contato já me foi íntimo e gostoso. Ao longo do pátio que nos recebia logo na entrada, sete totens com áudios de alguns salmos, provérbios, trechos do Gênesis e Eclesiastes ficavam dispostos para nós sentarmos e assim experienciarmos o exterior.
A construção seguia a mesma lógica das demais. Por fora, um casarão típico colonial, mas dentro, sempre, sempre mesmo, nos deparávamos com singularidades e prestígios de cada um.
O andar debaixo permitia, como o de Santa Ana, enxergar o antigo e o novo. A maneira como optaram por realizar a acessibilidade no prédio continuava a pensar na intervenção como ferramenta cuidadosa e de interferência mínima. As salas eram dispostas com peças sacras históricas, terminais multimídia ou centros educativos.
A curadoria me surpreendeu e me vi embalada em cada seção daquelas exposições, imaginando o passado e sobretudo o agora.
Pátio
Ouvi quando entrei, me sentei, apreciei
Cada parte daquela parte, me encantei
Perguntei
Toda ela era nova, na verdade toda não
Toda história tem dois lados
Toda música, uma canção.
FAZENDA DO JACÓ
Ao terminarmos o almoço, a viagem já estava no fim. Dalí, seguiríamos direto para a fazenda do Jacó, nossa última parada.
Chegando na propriedade, já entrelaçados pelo sono e cansaço de algumas horas de viagem, nos colocamos para escutar o herdeiro da família, atual dono da fazenda colonial, do século XVIII.
A visita começou já com um sentimento por mim de desconforto. Estar nesses espaços, palco de tanta violência e luta, é caminhar pelo extenso quintal e imaginar porque objetos e troncos espalhados ao longo dele ainda estavam ali.
Entrando na casa, a sensação de angústia só crescia. Ao saber das histórias, observando os cômodos com a planta original da época, foi capaz de transportar muitos de nós para o horrível cenário do Brasil do século XVIII.
Tensão, desconforto e medo foram alguns dos sentimentos que me atravessavam, em cada parte daquela casa.
Pelo cenário e fatos documentados, não ergui a mão uma vez sequer para documentar o espaço. Estava ali, um tanto chocada, abalada e sem vontade de interagir. Ainda que inexistentes na minha câmera, minha memória não há de excluir.
Oco
Silêncio.
Vazio e desconhecido
A memória daquilo tudo, ressurgia.
Ainda que abalada, minha calma eu obtinha
Foram longos e maus momentos,
que seguiam e seguiam.
Rápido foi depois, os instantes
Eternos demais.
ÔNIBUS – VOLTA
Saindo da visita densa na fazenda, seguimos com o ônibus em direção a Petrópolis. A volta, diferente da ida, foi marcada pela união das turmas, em que manhã e tarde viraram um só.
Histórias e confissões da viagem foram sendo passadas de um a um. Experiências individuais e memórias marcantes iam se misturando e tecendo uma grande teia da viagem, que ia ficar guardada em cada um de nós, para sempre.
Foi por meio de brincadeiras, ou longas horas de músicas, indo de Kelly Key a Djavan, que nós nos fizemos lar.
Sem dúvida, cada sensação, emoção ou expectativa ficou registrada na memória. A faculdade é o momento da vida em que nos debruçamos com alma em nosso futuro. Fazer arquitetura segue sendo desafio cotidiano e loucura diária, mas que bom poder ter esses momentos de suspiros, conhecimentos e partilhas.
Eram quase oito horas da noite e chegávamos a Petrópolis. Todos exaustos e abalados pelas longas horas do percurso.
Mas, sem dúvida, pedindo bis.
Volta
Babamos pelo que vimos e vivíamos
Sorrindo pelo que conseguimos.
Era tanta loucura, vontade de mais
Gritaria, gargalhada, confissões geniais
O sentimento era um só e o fim era de todos
Mas a gente tá tão feliz, tomara que o bis
Retorne de novo.
CONCLUSÃO
Posto o relato, a viagem a Tiradentes me proporcionou uma imersão profunda nas emoções e sensações de cada local visitado. Desde o início do trajeto de ônibus até o retorno, cada etapa revelou facetas únicas da cultura, história e paisagem mineira.
A visita à Fábrica de Pisos Hidráulicos em Barbacena conectou-me com o modo de fazer, enquanto o Museu de Santana e o Museu do Padre Toledo ofereceram uma visão rica da religiosidade e arte sacra da região. A Pousada do Bebeto e a Fazenda do Jacó trouxeram momentos de tranquilidade, e a cidade de São João del-Rei e o Museu da Liturgia enriqueceram a jornada culturalmente.
Cada poema inserido no relatório expressa intimamente as impressões e sentimentos vividos, proporcionando uma conexão pessoal com cada local visitado. Este trabalho, ao relatar emoções e reflexões, busca transmitir a essência da experiência.
Dessa forma, a viagem foi uma jornada de descoberta e introspecção, fomentada pelo patrimônio natural e cultural. O relatório, através de descrições e poemas, compartilha a riqueza dessas vivências, convidando o leitor a uma viagem emocional e sensorial por Tiradentes.
Feliz demais de fazer parte desse projeto e poder compartilhar minha visão de mundo!!
Nós que ficamos imensamente felizes com seu texto. A casa é sua, volte sempre Dora! Parabéns!